Hora e vez do Marketing Político Cidadão e das Pesquisas. Entrevista com Caio Manhanelli

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Ano de eleições é ano de ouvirmos falar mais de marketing político e dos especialistas neste campo.

Houve um tempo em que era dito que candidato vendia-se igual sabonete ou outro produto qualquer. Bastava evidenciar os benefícios principais, esconder os aspectos negativos e embrulhar com papel de presente.

As coisas vem mudando e os profissionais do setor também. As campanhas para altos cargos executivos poucas vezes são comandadas por publicitários. A realidade vem pedindo um perfil mais sensível e mais em sintonia com a sensibilidade social.

Exigem-se requisitos de cidadania e visão sociológica para entender a esmiuçar a comunicação dirigida a uma sociedade mais complexa e muito mais rápidas nas informações. Todo mundo sabe de tudo.

Para comentar este panorama eleitoral, o Portal PRO LEGISLATIVO entrevistou o sociólogo e especialista em campanhas políticas Caio Manhanelli, da CONSULTA, empresa com expertise também no campo de pesquisa qualitativa e quantitativa.

Redação: Pesquisas eleitorais sao muito usadas em campanhas do executivo. Mas elas podem ser usadas em campanhas para o legislativo ?

Caio Manhanelli: Sim. Pesquisa de Opinião é fundamental para uma “campanha” bem feita. As aspas se explicam. Importamos muitos conceitos do Marketing Comercial e da Propaganda, e um deles, o principal é “campanha”. A noção vem da ideia de “campanha publicitária”, que fora de nosso país é aplicada na política tal qual se aplica no mercado privado, usam-se itens promocionais, faz-se grandes festas, comícios, usa-se brindes, e etc. Exemplo disso são as campanhas estadunidenses e de vários países da américa hispano-latina. Se importamos do Marketing Comercial o conceito de “campanha” para o Marketing Político, devemos, para fazer direito, importar seu conjunto, o mais completo possível dentro do que nos permite a lei, e para o Marketing a Pesquisa é essencial, pois marketing é mais que vender, é mais que fazer propaganda ou publicidade, é planejar, é conhecer seu eleitor, é saber se o que ele demanda de um político é o mesmo que o candidato deseja oferecer. Nesses termos, não há diferença entre campanhas majoritárias e proporcionais, se é para fazer uma boa campanha, que tenha chance de sucesso eleitoral, é preciso fazer pesquisa.

Redação: O que elas podem proporcionar na estratégia destas campanhas, como para deputados ?

Caio Manhanelli: A grande diferença de pesquisas para disputas majoritárias (lembrando que os votos de um senador também são contados dessa forma) para pesquisa feitas para disputas proporcionais é o que chamamos, em termos técnicos, “universo”. Universo é a população alvo de sua campanha. Para um candidato que disputa uma eleição de contagem majoritária dos votos o que interessa é a maioria, de forma bem pragmática, o objetivo da campanha é quantitativo, é alcançar a maioria dos votos do “universo”. Daí esse universo é bem delimitado, se em um estado, é o total de eleitores do estado, se é um município, o total de eleitores do município, e assim por diante. No caso de cargos proporcionais o objetivo não é, necessariamente, voto, mas estar entre a lista dos eleitos, o que quer dizer, em termos numéricos, um calculo bem complicado. Na prática, alguns candidatos não eleitos podem ter alcançado mais votos individualmente do que outros eleitos (vide o “efeito Eneas”), pois os votos que valem para a conta são os votos da legenda e/ou partido. Isso gera um fator de incerteza bem grande para um planejamento de marketing, o que faz com que as pesquisas para esses casos sejam mais necessárias ainda. Quanto mais variáveis existem em uma situação, mais necessário é um planejamento, e nesse caso, existe uma imensidão de variáveis, incluindo decisões das executivas partidárias sobre coligações, que muitas vezes são alheias aos candidatos. Sem pesquisa não se faz marketing, sem marketing não há planejamento adequado para uma campanha que queira ser bem sucedida. A principal função de uma Pesquisa de Opinião para um candidato em disputa proporcional não é a quantidade de votos que esse candidato tem, mas as demandas do eleitorado-alvo desse candidato, os elementos no qual serão construído seu discurso de representação, seu discurso eleitoral para alcançar votos.

Redação: O comportamento e opinião das pessoas hoje em dia é bastante dinâmico. A pesquisa ajuda a captar o humor e interesse desse eleitorado?

Caio Manhanelli: Sem dúvidas! Esse é o principal dado de uma pesquisa, as opiniões sobre imagem, demandas, avaliações de governos, mais do que a própria intenção de voto, ao contrário do que pensam a maioria dos políticos e candidatos. Um bom planejamento considera pesquisas bem cedo em uma campanha, para se estabelecer a relação entre voto e opinião. Quando a população vai aderindo ao movimento eleitoral, quando vai de fato decidindo seu voto, quando chega-se perto da campanha, as pesquisas anteriormente feitas servirão de lastro para compreender o movimento dos índices de intensão de voto. Se as pesquisas só se mantiverem em captar a intensão de voto, sem outros dados agregados, o movimento eleitoral acaba acontecendo sem que o candidato perceba, e, não são poucos os casos pelo país, aqueles candidatos que se julgavam vitoriosos acabam se frustrando quando abrem-se as urnas.

Redação: Fala-se que vence a campanha que melhor atende o imaginário da população. Nem sempre a campanha mais pragmática e realista. O que isso quer dizer ?

Caio Manhenelli: O imaginário e a emoção da população é bem realista, só que responde a uma realidade, muitas vezes, diversa da realidade que os políticos acreditam enxergar. Dizemos sempre, “campanha boa é aquela campanha que desperta emoção”. Mas isso não diverge da ideia de realidade. Não se constrói laços emotivos sem elementos de realidade. Se Lula, por exemplo, não fosse um “homem do povo” de fato, não seria possível “vender” essa ideia, se Collor não fosse de fato um “homem de ação”, não seria possível fazer a campanha que foi feita por ele em 1989. O mecanismo de escolha, sobre qualquer coisa, passa por diversos fatores, mas o essencial é de fato o “imaginário”, pois ele é construído a partir da experiência que se tem em relação ao que se deve escolher, e o tempo em que se está exposto à questão da escolha influencia, e muito, na construção desse imaginário. Agora vejamos, quanto de fato nos é dado tempo para pensar política? Em novelas, em telejornais, em jornais impressos e em rádios, que são lidos, ouvidos ou assistidos, justamente quando estamos em nosso “tempo vago”, quando não estamos trabalhando e pensando em como sustentar nossa vida “real”, a imagem sobre políticos é apresentada de forma deturpada e negativa. Política, futebol e religião não se discute, diz o adágio. São tabus. E tabus são feitos para que não pensemos sobre o assunto. Então, como é possível, só em três meses, de dois em dois anos, tratar a política como algo que seja puramente racional? É esperar que tenhamos gasto tempo, durante o um ano e nove meses, com algo que não nos trás retorno para nossa vida pragmática e real, para nosso trabalho, que sustenta nossas vidas diárias. O melhor discurso político é aquele que trata da vida real dos seus eleitores, não de abstrações político-econômicas sobre o bem estar do país (o que para muitos, isso é ser pragmático e realista).

Redação: No seu entendimento o embate eleitoral maior hoje em dia é ideológico, administrativo ou moral ?

Caio Manhenelli: Por incrível que pareça, é essencialmente administrativo. Nem nos Estados Unidos ou na Europa é de fato ideológico. Existem níveis e/ou tempo na campanha e públicos específicos para cada aspecto desse debate político. É ideológico para aqueles militantes partidários que associam seu vínculo com a política às suas crenças sobre como deve ser administrado um país (e aqui é um país, não importa se o pleito é estadual ou municipal). É moral para aqueles eleitores que associam de forma mais personalista o voto, considerando que o “caráter” do candidato, sua probidade é o indicativo principal para mostrar que ele será um bom administrador. É puramente administrativo os argumentos sobre o que foi feito pelo candidato, seja em sua vida antes da política ou já em seus mandatos anteriores, em relação ao sucesso de sua gestão (pública ou privada). No fundo, a questão política é administrativa, o que difere de fato, como já disse anteriormente, é o quanto o eleitor tem de tempo para pensar a política, e que tipo de “atalho” vai usar para “economizar tempo” na decisão de seu voto. Pode ser o atalho ideológico, moral, ou até mesmo administrativo em si, mas o voto de fato será um momento de “adesão”, de crença, de fé que o eleitor deposita a um ou outro candidato, o voto é esperança, por mais descrente que seja o eleitor. Por isso é essencial o uso de pesquisas, para mapear quais são os eleitores que aderem ao candidato por tal ou qual discurso, e para saber, no planejamento estratégico, quais são os melhores argumentos e o momento ideal de usa-los.

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Redação: Fazer campanha só com amigos e não profissionalizada ainda é comum ou os candidatos já tem outra visao pelo interior brasileiro ?

Caio Manhenelli: Infelizmente, ainda é comum, até em grandes capitais. Mas isso tem razões que vão além da falta de visão dos candidatos, que também contribui. Tem a ver com a própria gestão da “política” pelos dirigentes partidários, com a falta de recursos para operacionalizar campanhas mais profissionais, o que também remete às leis extremamente restritivas em relação às contas e gastos eleitorais, com a falta de gestão de campanhas a partir dos partidos, sendo sempre carregadas pelo próprio candidato, inclusive financeiramente, tem a ver com a falta de profissionalismo dos próprios financiadores (empresários), que não buscam estudar quem serão seus “patrocinados”, entre outros fatores. O que é exemplo para nós em outros países é justamente essa gestão mais ampla dos esforços de campanha. Quando estive na Colômbia, ministrando um treinamento para as equipes e candidatos ao Senado e às câmaras legislativas locais (deputados) e orientando estrategicamente cinco campanhas, percebi que há um comprometimento maior dos partidos em fornecer mais estrutura para seus candidatos, seja financeira, seja com material e treinamento, até com estratégia. Obviamente existem, como em todos os cantos do mundo democrático, aqueles que recebem mais atenção, por terem mais potencial, mas esse empenho por parte da estrutura partidária, de fato a instituição mais democrática desse sistema representativo, é desempenhado por muitos poucos partidos no Brasil, e isso atrapalha muito a profissionalização de fato das campanhas eleitorais em nosso país.

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